Rui Saraiva – Portugal
“Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão” é o tema da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos que terá lugar em outubro de 2023. Mas, o mais importante é o caminho a percorrer até essa data. Assim, na terça-feira 7 de setembro, foi apresentado o Documento Preparatório que terá agora utilização concreta na fase diocesana do Sínodo. Um processo sinodal que tem início oficial em Roma nos dias 9 e 10 de outubro e no dia 17 do mesmo mês a ativação em cada uma das Igrejas particulares.
À margem da apresentação à imprensa do Documento Preparatório, o cardeal Mario Grech, secretário geral do Sínodo dos Bispos, sublinhou ao Vatican News a importância da consulta e apelou aos bispos para que seja dado espaço à escuta de todos:
“O sucesso do Sínodo dependerá do sucesso da consulta. Por isso o meu apelo aos bispos para que saibam organizar bem e dando espaço para ouvir todos. E esperamos que o caminho que iniciaremos hoje não parará” – declarou o cardeal.
O purpurado salienta que a Igreja como mãe inclui todos, mesmo aqueles que deixaram a Igreja instituição.
“A Igreja não são só os que enchem os primeiros lugares. A Igreja como mãe inclui todos, mesmo aqueles que não praticam, mesmo aqueles que deixaram a Igreja instituição. Este Sínodo é um convite a todos para estarem juntos e escutar aquilo que o Espírito Santo está dizendo. O Espírito Santo não faz distinções” – afirmou.
O Documento Preparatório questiona quais os passos que o Espírito nos convida a dar para crescermos como Igreja sinodal? Para responder a esta pergunta, a Secretaria do Sínodo salienta a necessidade de “viver um processo eclesial participativo e inclusivo” que ofereça a cada um, de maneira especial àqueles que se encontram à margem, a oportunidade de se expressarem e serem ouvidos. Também é feita a proposta de análise ao modo “como a responsabilidade e o poder são vividos na Igreja”.
Caminho conjunto
A Igreja está a viver tempos de sinodalidade. Para aprofundarmos o conceito fomos à procura de respostas. O padre português Sérgio Leal, da diocese do Porto, defendeu em 2018 uma tese de licenciatura na Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma, sobre a sinodalidade como estilo pastoral.
Muito em breve com a chancela da Paulinas Editora o padre Sérgio Leal publicará um livro sobre a sinodalidade no magistério do Papa Francisco. Nas próximas semanas vai-nos acompanhar com as suas reflexões neste momento tão especial da Igreja. Em entrevista começa por lembrar a origem da palavra: caminho conjunto.
“Em primeiro lugar, a melhor forma de descrever a sinodalidade é indo à etimologia. O Papa Francisco faz isto sempre que fala de sinodalidade. Diz ele: ‘Sinodalidade, tudo aquilo que a caracteriza está contido na palavra synodos, caminho conjunto’. Caminho de toda a Igreja: pastores, fiéis, consagrados, religiosos, religiosas, todos os batizados. E, portanto, podemos dizer que sinodalidade é, em primeiro lugar, um caminho conjunto. É verdade que hoje muitas vezes falamos de sinodalidade ligando a estruturas de corresponsabilidade e de comunhão, eu diria que mais do que estruturas ou um somatório de estruturas a sinodalidade é um estilo, um modo de ser Igreja” – afirmou.
Escuta recíproca, escuta alargada
O sacerdote português recorda, em particular, as palavras do Papa Francisco no seu discurso assinalando os 50 anos da instituição do Sínodo dos Bispos. Foi a 17 de outubro de 2015. O Santo Padre afirmou que “Igreja e Sínodo são sinónimos” porque a “Igreja não é outra coisa que não seja caminhar juntos”.
“Este texto dos 50 anos do Sínodo dos Bispos …e deixo já esta nota: quem quiser perceber o que é a sinodalidade no magistério do Papa é imprescindível a leitura deste texto. O Papa aqui apresenta uma síntese articulada e concisa e consistente daquilo que entende ser a sinodalidade. De facto, dizer Igreja significa dizer sinodalidade, caminho conjunto. O São Cipriano dizia e depois o Concílio Vaticano II colocou no número 4 da Lumen Gentium que ‘a Igreja é o Povo de Deus que caminha na unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo’. Ou seja, esta consciência de uma Igreja como povo que caminha em conjunto é essencial para entendermos a missão da Igreja. Se a identidade da Igreja é ser comunhão, unidade, caminho conjunto, então o seu agir deve ser moldado a partir daqui. O Papa diz em primeiro lugar que caminhar juntos implica uma escuta recíproca. Isto é, não uma visão unidirecional de serem os fiéis leigos os destinatários da ação eclesial, mas de percebermos que o protagonista da ação da Igreja é todo o povo de Deus. Na diversidade de ministérios, de carismas, de funções, de serviços. E se há diversidade de ministérios e de serviços é porque numa Igreja comunhão não fazemos todos o mesmo, mas na reciprocidade dos diferentes dons cada um vai realizando aquele que é o projeto de Deus para ele. Portanto, escuta recíproca: pastores que escutam os fiéis, fiéis que escutam os pastores. E de uma Igreja que conjuntamente escuta a voz de Deus. Escutando a voz até dos não-crentes. O Papa diz isto. Uma escuta alargada que escuta o grito do mundo para aí escutar a voz de Deus e que escuta a voz de Deus para aí escutar os desafios da história. Depois o Papa diz uma coisa muito interessante neste discurso: uma Igreja que aparece como sinal de comunhão e de unidade no tempo de dispersão. Num tempo como o nosso pós-moderno, a Igreja apresentar um caminho que respeita a diversidade, que promove essa diversidade, mas que ao mesmo tempo promove uma unidade nesse caminho este é também um sinal para os tempos que vivemos” – disse o padre Sérgio Leal.
A marca da humildade
O padre Sérgio Leal destaca que uma Igreja sinodal é também uma Igreja da humildade.
“A igreja sinodal é uma Igreja que se reconhece como instrumento nas mãos de Deus. Como lugar da ação de Deus. E se nos entendemos lugar da ação daquele que é maior do que nós, então reconhecemos a nossa condição humilde que em nada nos enfraquece, pelo contrário nos engrandece. E neste sentido a Igreja sinodal é uma Igreja também da humildade. A escuta pressupõe a humildade de me perceber a caminho com outros. Uma Igreja da escuta, uma Igreja sinodal não me coloca acima do outro, mas a caminho com ele. E é este novo modo de ser e de estar como diz o documento da Comissão Teológica internacional, este “modus vivendi et operandi” que caracteriza a sinodalidade e por isso faz dela, não apenas um método, não um conjunto de estruturas, mas um estilo, um modo de ser Igreja, uma dinâmica que nos conduz à conversão pastoral, que caracteriza o nosso modo de ser e por isso deve estar presente no modo de agir da Igreja. E, por isso, uma Igreja que não se reconheça humildemente a caminho, que não tenha esta atitude de humildade, de uma escuta que pressupõe silêncio… Nós estamos habituados a uma Igreja que tem sempre a última palavra sobre tudo, que tem sempre uma palavra para tudo. E diante dos dramas da história, muitas vezes, também a atitude de silêncio, de escuta, de quem está a caminho, de quem não é autossuficiente e autorreferencial, porque a Igreja nasce de Deus e para Ele caminha, isto traz uma nova marca”.
O padre Sérgio Leal continuará connosco nas próximas semanas para aprofundar este tema que vai marcando o tempo da Igreja.
“Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão” um Sínodo que, após as fases diocesana e continental dos próximos dois anos, terá em outubro de 2023 em Roma a sua Assembleia Geral Ordinária. Para que mais do que “produzir documentos” seja possível “fazer florescer a esperança”.
Laudetur Iesus Christus
Fonte: vaticannews.va